terça-feira, agosto 05, 2008

Estrada para o Inferno - parte 1 - Chuva

"O homem é o lobo do homem." - Hobbes

A chuva que cai ensopa o meu terno caro, nas ruas da Avenida Paulista as pessoas circulam sem olhar nos olhos uma das outras, um hippie fedorento guarda seus trabalhos, eu posso ver os seios daquela morena de camisa branca. Queria que a chuva lavasse os meus pecados, mas isso é impossível em São Paulo, se fosse há alguns anos, poderia se dizer que a chuva é uma das águas mais limpas, mas nào nessa selva de pedra. Aqui chove enchofre, igualzinho ao inferno.
Há 10 anos, eu não pensava assim. Chovia na Lapa de Baixo, eu desci do trem ansioso, um ano de estudo, um concurso público concorrido, seis meses de treinamento de elite, as melhores notas, agente da polícia federal... a felicidade era tanta que o fedor do mercado municipal e as ruas abarrotadas de camelôs não me incomodavam.
Chegando na Superintendencia Regional da Policia Federal, fui encaminhado para a Diretoria de Combate ao Crime Organizado (DCCOr), deveria conversar com o Delegado Jaques Luba e fora isso não sabia de mais nada. O nervosismo, a ansiedade, e meio maço de cigarros depois, sou chamado.
Eu acreditava no sistema. E apurar as irregularidades nos três poderes, vigiar, punir, era o sonho de uma criança viciada em filmes noir realizado. Que tipo de idiota as portas do século XXI ainda acredita no pacto social? Bem, eu acreditava e estava pronto pra ser um novo defensor do sistema.
Na sala do Jaques, milhares de papéis e cheiro de cigarros misturados com um aromatizador barato, na minha frente dois sujeitos, um cara gordo, de olhos azuis e profundos, sorriso simples, pele avermelhada, cara de polonês, bonachão, se tivesse barba poderia ser o papai noel, mas por trás da aparência risonha, um olhar que analisava tudo a fundo, como se pudesse enxergar o seu caráter, antes mesmo que vc fosse capaz de pronunciar uma palavra, essa foi a minha primeira impressão do Luba. Em pé ao seu lado, com uma pasta na mão, um sujeito magro, altivo, ligado no 220, boca suja, compulsivo, me olhava como se eu fosse algum tipo de animal, bufava bastante, e mesmo que fizesse frio naquela tarde, suava bastante.
Sentado na frente dos dois, aquele seria o primeiro dia, de um inferno que nem em meus piores pesadelos, eu poderia imaginar...


continua...

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